Não me esforço para lembrar, sinto que não devo racionalizar, então que as faíscas sejam o suficiente para manter a chama acesa para toda minha existência, e que esse relato me sirva delicada e sutilmente dos sabores daquele momento único e transcendente…
Imagem produzida com nightcafe.studio
Quando entrei no círculo todos já estavam lá; chamaram meu nome, e eu não sabia o que esperar.
O chão estava lá. O fogo, a mata, a àgua e a risada. Vibrando ao meu redor a morte e o sopro, a penumbra e a sombra; os ecos do último passo que eu precisava dar.
A escolha e a trasgressão.
O véu estava lá. Mas eu o pude sentir rasgar. Um tremor, um rugido, lapso de olhar. A garganta e o véu; sim eu o vi rasgar.
A prece e suas palavras de metal; a faca e sua lamina de metal; o sangue e seu odor pungente de metal.
Meu corpo tremulo, o silencio efemero e a certeza do seu aproximar. Eu quis me entregar, mas eu tinha um último passo para dar.
A noite estava calma, embora o rebuliço em mim estivesse forte, meu coração batia como um corcel em fuga, e a lua como um farol guiando o caminho para o ar, eu sentia o pó carregado pelo meu próprio mercúrio, a alquimia que me envenenou com paixão, alimentou meus sonhos com loucura e criara um fio invisível me ligando ao meu próprio coração.
memento vivere & memento mori.
Três corações a sangrar. E minha Arte sendo pintada: com luz, sombra e sangue.
Os olhos que eram meus, vendo com suas cores em todo o lugar; a voz que era minha; buscando um tom que minha garganta nunca conseguiu usar; as mãos que eram minhas vendo a dúvida se esvair entre os dedos, escorrendo: o sangue e os medos…era hora de atravessar.
Foi antes ou depois, foi agora ou será amanhã? Daqui muitos anos; há muitas vidas passadas; naquele momento e agora: o tempo para nós não é nada. Eu sinto o poder no âmago me levar, tremeluzindo e em poucos instantes eu já estou de novo lá? Ou é você que aqui está?
Eu fervia por dentro com uma dança prestes a explodir do em cada átomo; todas as marcas começaram a vibrar, o corpo tão quente que o sangue pintou-as como gelo sobre minha carne, tão frio à ponto de queimar. Podia sentir cada ponto pulsar, como se todas as veias também precisassem sangrar, o fluido se misturar, a transformação se concretizar: chiaroscuro.
Imagem produzida com nightcafe.studio
.morri e renasci em minha luz e sombra.
Que lindo esse poema pra descrever o tão sublime momento !